Almanque Picolino
“Eu, Corpo, e Arame. Arame lá, quieto, imóvel, sem significado. Eu aqui quieto, em chão firme. Quando subo no Arame, tudo ganha significado: desafio, superação, equilíbrio. Mas Arame não faz nada, inerte. Sou eu que faço. Por mais baixo que seja, a perspectiva já mudou, o chão parece tão longe. O fio é tão fino, quase invisível. Primeiro passo. O pé balança para um lado e para o outro, sem firmeza. Se olhar para baixo, o equilíbrio fica mais difícil, mas como não procurar com o olhar esse fio que parece sumir sob os pés? É o pé que tem de vê-lo, tateá-lo, deslizando. Mas o corpo dobra para um lado e para o outro, trôpego, os braços sacodem, procurando onde se agarrar. A mão do instrutor! Como é que pode ser tão fácil ficar de pé no chão? Não preciso prestar atenção em nada! Aqui em cima, cada gesto milimétrico faz diferença. A atenção é total, atenção em mim mesmo. O equilíbrio tem de ser encontrado em meu próprio corpo. O eixo, o ponto de equilíbrio, os movimentos de reequilíbrio, o domínio do próprio corpo.”
Tudo isso se passa em segundos, nem chega à consciência. Mas opera direta e imediatamente no corpo. Poderíamos seguir descrevendo o processo de cada técnica: as mudanças de pontos de referência ao pendurar-se por um pé de cabeça para baixo, na Corda Indiana; ao ficar de pé na barra instável, no Trapézio; a coordenação para manter bolas girando no ar, no Malabarismo; o equilíbrio dinâmico, no Monociclo; o mais puro domínio do movimento corporal, na Acrobacia; a flexibilidade e plasticidade, no Contorcionismo.
CONCENTRAÇÃO, RITMO, ALEGRIA...
A aprendizagem do Circo é uma aprendizagem do Corpo. Convidamos você a embarcar conosco na subversão do conceito de Corpo. Quando nos referimos a corpo, estamos indo além do corpo-físico, corpo-fisiológico, corpo-sensorial. Inclua-se no significante corpo as dimensões corpo-emocional, corpo-simbólico, corpo-mental, corpo-relacional e, por que não, corpo-histórico. A ação da aprendizagem das artes circenses se dá nesse corpo multidimensional.
Esse processo implica concentração, perseverança, equilíbrio, ritmo, coragem, alegria, coordenação, flexibilidade, auto-imagem, estética, autodisciplina, autoconfiança, segurança – para falarmos apenas dos processos individuais. O circo transforma. Transforma o impossível em possível. Transforma o corpo. Transforma o ser. Transforma o conviver.
Desejo é fundamental - Não confundir frustração inicial com desinteresse
Se a criança ou adolescente chega pelas mãos de alguém e não se envolve de alguma forma, é pouco provável que a atividade do circo lhe seja mobilizadora. A pessoa tem de se encantar. É importante observar o desenvolvimento desse interesse que pode levar um tempo até aparecer. Ou pode ser oscilante, e não deve de repente ser confundido como desinteresse. Um possível desinteresse que acontece inicialmente pode vir junto com frustração, e que também faz parte do processo.
Para o novo aluno é maravilhoso ver todo o mundo jogando malabares, subindo na corda, andando de monociclo. Mas é muito diferente da experimentação. Muitas vezes, a criança ou adolescente acha que vai subir no monociclo e sair andando. E não acontece. Sobe, e cai, sobe, cai de novo. Tem mais insucessos que sucessos, na tentativa. É natural que ocorra frustração no início; é preciso distingui-la isso do legítimo desinteresse.
Em todo caso, o desejo é fundamental.
DOSAGEM DO DESAFIO
É incomum, mas acontecem casos em que a criança não se identifica com o circo. Na maioria das vezes, chega a Picolino porque o pai quer, ou o educador, ou a instituição. Nesses casos, conversamos e, posteriormente, nos reportamos ao adulto, na verdade o desejante desta situação. Mostramos que não é assim que funcionamos, não basta o querer do outro. Se não houver opção, preferimos que a criança ou adolescente fique na Picolino, a ficar sem outro atendimento. Mas, em muitos casos, existem outras opções.
Além do interesse pela atividade circense, a escolha também é fundamental no processo de aprendizagem. São oferecidas diversas técnicas, cada uma com diferentes possibilidades para que o aluno possa identificar-se e optar por duas. O desejo e o respeito à escolha são imprescindíveis e estão acima do reconhecimento, por parte do professor, ou de uma aptidão corporal.
Durante as aulas, é importante a dosagem do desafio proposto a cada criança, para que não esteja além ou aquém de suas possibilidades. A autonomia também se faz presente na medida em que cada um é responsável por seu aprendizado, aceita novos desafios e enfrenta novos limites. Esta aprendizagem pode demorar a resultar em performance técnica, mas as aquisições durante o processo são valiosas para o desenvolvimento global do aluno.
Reconhecer o desejo, dar sentido à vivência e legitimar as escolhas possibilita à criança ou adolescente reconhecer-se como sujeito de direitos.
Fonte: Almanaque Picolino 2004.
E para quem se interessou, há vagas nos seguintes horários:Básico para crianças e adolescentes: às terça e quintas, das 14 às 17h.
Além das técnicas básicas de circo, há aulas complementares de jogos, brincadeiras, oficinas lúdicas e de leitura. Esta turma tem alunos encaminhados por projetos sociais e é também uma oportunidade de vivência para crianças e adolescentes da classe média.
Custo mensal: R$ 120,00;
Básico aos sábados: das 14 às 17 horas.
Para jovens de todas as idades a partir dos 07 anos. Com ênfase na atividade física, é frequentado por por pessoas que querem manter a forma física e ao mesmo tempo aprender técnicas básicas de circo. Custo mensal: R$ 80,00.
Como a procura tem sido grande, principalmente de pessoas que trabalham, há possibilidade da abertura de turma noturna, às terças e quintas, a partir das 18h30.
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